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sexta-feira, 10 de fevereiro de 2012

Opinião: Uma Revista de Errologia para a comunicação empresarial

Uma notícia que pode parecer estranha à primeira vista (tentaremos convencer os nossos leitores de que, muito pelo contrário, ela traz uma lógica e uma razão implícitas) chamou a atenção da comunidade científica recentemente: está sendo lançado um periódico para dar conta das pesquisas que não deram certo. Ou seja, em vez de relatar resultados bem sucedidos das investigações, ele vai focar aquilo que não funcionou.

A iniciativa é de um biólogo brasileiro chamado Eduardo Fox, da UFRJ – Universidade Federal do Rio de Janeiro, e tem como objetivo apresentar os experimentos que falharam ou chegaram a um resultado inesperado. O periódico científico se intitula “Journal of Errorology” (Revista de Errologia)  e publicará situações a que os pesquisadores chegaram mas que ainda não têm explicação científica.

A justificativa faz sentido: os erros cometidos, se estudados, assumem um caráter pedagógico e este processo de análise (e até de autocrítica) pode evitar que outros pesquisadores cometam os mesmos equívocos.

Todos sabemos que as revistas científicas (o mesmo acontece com as teses defendidas nas principais universidades em todo o mundo) sempre relatam o que deu certo, ou mais precisamente as hipóteses e métodos utilizados pelos pesquisadores acabam se mostrando apropriados ao final e a conclusão é uma só: eles sempre pensam e agem correto, são, portanto, infalíveis ou geniais.

A experiência tem demonstrado que não é bem assim e que muitas vezes a idéia original acaba mudando de rumo no meio do caminho mas, como faz parte da arrogância científica não confessar estes deslizes de pensamento e precariedade de técnicas e métodos , tudo parece que foi concebido e realizado da maneira ideal. Além disso, por razões comerciais, muitas pesquisas (sobretudo na área da saúde/Medicina, mas vale pra todas as áreas, como por exemplo a de biotecnologia, com a descarada apologia dos transgênicos) acabam tendo os dados manipulados para atender os interesses comerciais das empresas que as patrocinam (a BigPharma frauda ostensivamente os dados para favorecer os seus medicamentos, em muitos casos conferindo-lhe a eficácia que não têm!). Cientistas (???) e empresas alteram os dados para “aparecerem bem no filme e obterem vantagens pessoais ou comerciais”. O número de relatos de fraudes científicas tem crescido bastante nos últimos anos.

Por causa disso, uma Revista de Errologia vem a calhar. É útil  saber o que (e por que motivo) deu errado e mais importante ainda seria descobrir o que pesquisadores fizeram para que os erros das suas pesquisas fossem mascarados.

Embora esta Revista esteja sendo cogitada provavelmente para as chamadas ciências tradicionais, estaremos defendendo aqui a criação imediata de uma Revista de Errologia focada na comunicação empresarial. Puxa, ela cumpriria um papel importante, sobretudo no Brasil, porque o mercado nesta área anda padecendo de uma síndrome particular: a “do case de sucesso”.

Quem freqüenta os eventos (há congressos, simpósios, seminários às pencas em Comunicação Empresarial/Organizacional) ou acompanha as revistas, muitas editadas por entidades de prestígio, não tem dúvida: tudo ali acontece da maneira esperada, ou seja, todos os cases são de sucesso, um tedioso mundo cor-de-rosa. São sistemas de gestão de crises, esforços de relacionamento com a mídia,  projetos de comunicação interna que funcionam admiravelmente e que acabam recebendo as mais importantes premiações. Você já percebeu como há prêmios nesta área? Se for atento, irá descobrir que, em muitos, muitos casos, recorrentemente, são contempladas as empresas em que trabalham os diretores das entidades que os concedem. Santa coincidência, não é?

Pois é, esta hipocrisia empresarial mereceria uma Revista de Errologia, que nem precisaria ter um caráter estritamente científico, mas profissional.  Afinal de contas (vamos falar sério, gente?) nem tudo é uma “Brastemp” (que  aliás também não é uma Brastemp mas uma marca repleta de problemas) no universo da comunicação empresarial e há muita gente “comendo mortadela e arrotando caviar”.

Citemos alguns exemplos para ilustrar a nossa tese.

 A comunicação interna, na maioria das organizações, se caracteriza pelo autoritarismo das chefias, por culturas empresariais que, apesar do discurso, são avessas ao debate, ao diálogo e que cultivam apenas a adulação, o “oba-oba”, e odeiam a divergência de idéias e opiniões. Mas os cases de sucesso garantem que os funcionários são protagonistas de sua própria história, “o maior patrimônio da empresa”.  

As crises empresariais (e como há crises hoje em dia envolvendo as organizações!) , no relato de agências/assessorias e de gestores de comunicação, sempre acabam bem, o que significa que elas sempre fizeram o correto para administrá-las, mas a gente sabe que as empresas cometem graves equívocos nesses momentos (sonegam informações ou “se fecham em copas”, desrespeitam consumidores e outros públicos de interesse etc).

Os discursos empresariais sempre proclamam a responsabilidade social e a sustentabilidade das organizações mas andam invariavelmente descolados da realidade porque, no fundo, elas não querem abrir mão de seus lucros e fazem qualquer coisa para mantê-los, ainda que à custa da degradação ambiental, do prejuízo à sociedade etc. Pois não é que até a Apple, que sempre foi vista como um ícone moderno, acaba de ser desmascarada porque explora terrivelmente os que trabalham para ela em países asiáticos? O iPad, tão badalado, esconde em sua fabricação mortes e feridos e uma afronta dramática aos direitos humanos. Isso já aconteceu com a Nike, que explorou como pode o trabalho infantil, e aconteceu recentemente por aqui com a Zara, que desfila toda garbosa nos shoppings centers brasileiros, ao mesmo tempo que judia dos imigrantes em nosso País (foi condenada, mas pagou muito pouco pelo erro).

É fundamental que muitas revistas de Errologia sejam produzidas e que a verdade venha à tona, substituindo esta hipocrisia, este cinismo empresarial que deveria, em vez de aplausos e premiações, merecer o nosso repúdio.

É forçoso reconhecer que há empresas comprometidas com o meio ambiente, que respeitam os consumidores e que efetivamente se relacionam bem com os seus stakeholders e que, portanto, estarão, provavelmente, distantes da pauta destas revistas, mas a maioria delas merecia figurar nestas publicações.

Os erros precisam ser revelados não apenas para que os bem intencionados aprendam com eles e possam mudar, por decisão própria, de postura, de conduta, de atitude, mas para que o mercado e a sociedade acertem as contas com aqueles que insistem em cometê-los, penalizando o meio ambiente, os direitos humanos, a saúde ou a qualidade de vida dos cidadãos.

Como diz o ditado, errar é humano mas insistir no erro é burrice. Dissimulá-lo por motivos comerciais ou para satisfazer o ego de gestores de comunicação ou de agências/ assessorias é mais do que isso:  representa uma grande sacanagem contra todos nós. Revistas de Errologia neles.

Fonte: Portal Imprensa, artigos de Wilson da Costa Bueno.
Temos como intuito postar notícias relevantes que foram divulgadas pela mídia e são de interesse do curso abordado neste blog. E por isso esta matéria foi retirada na íntegra da fonte acima citada, portanto, pertencem a ela todos os créditos autorais.

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